sexta-feira, 2 de novembro de 2012


Stravinski e Giacometti

Stravinski por Giacometti
 

Robert Craft: Como foi que Giacometti veio a fazer desenhos de você?

Igor Stravinski: Ele tinha feito cinco ou seis esboços a partir de fotografias, antes de me encontrar, e não gostou. Depois, sentado bem perto de mim, fez uma série completa, trabalhando muito depressa, dedicando apenas alguns minutos a cada desenho. Diz que em escultura também dá a obra por terminada muito rapidamente mas que antes faz, às vezes vagarosamente, por longos períodos, centenas de estudos preparatórios, que são abandonados.

Desenhava com um lápis muito duro, e apagava as linhas com borracha, de vez em quando. E sempre murmurando: “Non... impossiblie... je ne peux pas... um tête violente... je n´ai pas de talent... je ne peux pas...”.

Ele me surpreendeu a primeira vez que veio, porque eu esperava um Giacometti alto e magro. Disse-me que acabava de escapar de um fabricante de automóveis o qual lhe oferecera uma soma considerável para afirmar que carros e esculturas são a mesma coisa, isto é, belos objetos. De fato, um dos tópicos favoritos de Giacometti era a diferença entre uma escultura e um objeto. “Os homens a andar na rua em diversas direções não são objetos no espaço. A escultura é uma matière transformada em expressão, expressão na qual a natureza conta menos que o estilo. A escultura é expressão no espaço, o que quer dizer que nunca pode ser completa: ser completa é ser estática. Todos os bustos são ridículos; o corpo inteiro é o único assunto da escultura”.
 
Giacometti
 
Sua conversa sobre escultores era, algumas vezes, surpreendente. Gostava de Pigalle, achava-o o maio escultor de dix-huitième, especialmente no monumento em memória da Maréchale de Saxe, em Estrasburgo. Preferia de longe o rejeitado Voltaire nu, de Pigalle, ao famoso Voltaire oficial de Houdon “por causa de seu maior nervosismo”.
 
Voltaire nu - Pigalle
 
Voltaire - Houdon
 
Para ele, Canova não era realmente um escultor, enquanto Rodin foi o “último grande escultor, da mesma linha de Donatello (não o Rodin de Balzac ou dos Bourgeois de Calais, naturalmente).” Brancusi não era absolutamente escultor, disse ele, mas um “fazedor de objetos”.
 
Perseu - Canova
 
Brancusi
 

Eu gosto da obra de Giacometti – tenho na minha sala de jantar uma de suas pinturas “cheias-de-espaço-escultural” e sinto afeição por ele, por seu próprio “nervosismo”. Gosto de sua maneira de ser, numa estória que me contou. Tinha grande admiração por Klee e, uma vez, no fim da década de 30, quando ambos os artistas moravam na suíça, ele finalmente decidiu ir visitá-lo. Caminhou da estação até o que julgava ser a casa de Klee – na encosta de uma montanha a certa distância da cidade – mas quando chegou, descobriu que Klee não morava ali, mas muito mais adiante para o alto da montanha. “Perdi toda a coragem e não fui – só tinha de ir até aquele ponto”.
 
O fantasma - Klee
 
NOTA: Texto do livro "Conversas com Stravinski". SP: Perspectiva, 1984. pp. 74-5

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