ilustração de Gerald Thomas
Então,
nossos ancestrais medievais eram felizes porque encontravam sentido na vida em
ilusões coletivas sobre a vida após a morte? Sim. Contanto que ninguém
destruísse suas fantasias, por que não?
Até onde sabemos, de um
ponto de vista puramente científico, a vida humana não tem sentido algum. Os humanos
são resultado de processos evolutivos cegos que atuam sem propósito ou
objetivo. Nossas ações não são parte de um plano cósmico divino, e, se o
planeta Terra explodisse amanhã, o universo provavelmente seguiria em frente
como de costume. Até onde podemos afirmar no presente momento, a subjetividade
humana não faria falta. Portanto, qualquer
significado que as pessoas atribuem à própria vida é apenas uma ilusão. Os sentidos
sobrenaturais que os medievais encontravam em sua vida eram não mais ilusórios
do que os sentidos humanistas, nacionalistas e capitalistas que as pessoas de
hoje encontram. O cientista que afirma que sua vida tem sentido porque ele
contribui para um aumento do conhecimento humano, o soldado que declara que sua
vida tem sentido porque ele luta para defender sua terra natal e o empreendedor
que encontra sentido em construir uma nova empresa são não menos iludidos do
que seus semelhantes medievais que encontram sentido lendo as Escrituras,
participando de uma Cruzada ou construindo uma nova catedral.
Então, talvez a
felicidade seja sincronizar nossas ilusões pessoais de sentido com as ilusões
coletivas predominantes. Contando que minha narrativa pessoal esteja alinhada
com as narrativas das pessoas à minha volta, posso me convencer de que minha
vida tem sentido e encontrar felicidade nessa convicção.
(In: HARARI, Yuval Noah. SAPIENS:
uma breve história da humanidade. Porto Alegre: LPM, 2015.)
YUVAL NOAH HARARI, é
doutor em história pela Universidade de Oxford e professor da Universidade
Hebraíca de Jerusalém.